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ORÁCULO DO SENHOR - Parte I

ORÁCULO DO SENHOR (Jr 31, 16-22)

Parte 1


Assim disse o Senhor:

Reprime o teu pranto

E as lágrimas de teus olhos!

Porque existe recompensa para a tua dor:

- Oráculo do Senhor –

Eles voltarão da terra inimiga.

Há esperança para o teu futuro:

- Oráculo do Senhor –

Teus filhos voltarão para o seu território (vv. 16-18).



O sofrimento é um tema universal, que acompanha o homem do seu nascituro até a sua morte. O sofrimento é inseparável da existência terrena do homem. O sofrimento humano suscita compaixão, inspira também respeito e, a seu modo, intimida.


Existe o sofrimento físico e o sofrimento moral. O sofrimento físico dá-se quando, seja de que modo for, “dói” o corpo; enquanto que o sofrimento moral é “dor” da alma.


A Sagrada Escritura é um grande livro sobre o sofrimento. Do Antigo Testamento fazemos menção apenas de alguns exemplos de situações que patenteiam as marcas do sofrimento; e, em primeiro lugar, do sofrimento moral: o perigo de morte; (cf. Is 38,1-3) a morte dos próprios filhos (cf. Gn 15,16; 37, 33-35; 2Sm 19,1) e especialmente a morte do filho primogénito e único; (Jr 6,26; Am 8,10; Zc 12,10) e depois também: a falta de descendência; (cf. Gn 15,2; 30,1; 1Sm 1,6-10) a saudade da pátria; (cf. Sl 137/136) a perseguição e a hostilidade do meio ambiente;( cf. Jr 18,18) o escárnio e a zombaria em relação a quem sofre; (cf. Jó 19,18; Jr 20, 7; Is 53,3) a solidão e o abandono; (cf. Sl 22,2-3; 31,13; 38,12; Jr 15,17; Is 53,3) e ainda outros, como: os remorsos de consciência; (cf. Sl 51,5; Is 53,3-6; Zc 12,10) a dificuldade em compreender a razão por que os maus prosperam e os justos sofrem; (cf. Sl 73,3-14; ) a infidelidade e a ingratidão da parte dos amigos e vizinhos; (cf. Jó 19,19; Sl 41,10; 55,13-15; Jr 20,10) e, finalmente, as desventuras da própria nação. (cf. Sl 44,10-17; 77,3-11; 79,11; 89,51).


Como se vê pelos exemplos referidos, na Sagrada Escritura encontramos um vasto elenco de situações dolorosas, por diversos motivos, para o homem. Este elenco diversificado não esgota, certamente, tudo aquilo que se sabe sobre o tema do sofrimento, ele continua no livro da história do homem - que é um “livro não escrito” - e no livro da história da humanidade, como um todo.


No fundo de cada sofrimento experimentado pelo homem aparece inevitavelmente a pergunta: porque? É uma pergunta acerca da causa, da razão e também acerca da finalidade (para que?);

trata-se sempre, afinal, de uma pergunta acerca do sentido. Esta não só acompanha o sofrimento humano, mas parece até determinar a própria vida humana: porquê e para quê existimos?


A dor, como é óbvio, em especial a dor física, encontra-se amplamente difundida no mundo dos animais, mas só o homem, ao sofrer, sabe que sofre e se pergunta o porquê; e sofre de um modo humanamente ainda mais profundo se não encontra uma resposta satisfatória. Trata-se de uma pergunta difícil, como é também difícil uma outra muito afim, ou seja, a que diz respeito ao mal. Por que o mal? Por que o mal no mundo? Quando fazemos a pergunta desta maneira fazemos sempre também, ao menos em certa medida, uma pergunta sobre o sofrimento.

Ambas as perguntas são difíceis, quando o homem as faz ao homem, como, também, as faz a Deus, Criador e Senhor do mundo. É bem sabido que, quando se calcorreia o terreno desta pergunta, se chega não só a múltiplas frustrações e conflitos nas relações do homem com Deus, mas sucede até chegar-se à própria negação de Deus. Essa pergunta encontrou a sua expressão mais viva no Livro de Jó.


É conhecida a história deste homem justo que, sem culpa nenhuma da sua parte, é provado com inúmeros sofrimentos. Perde os seus bens, os filhos e filhas e, por fim, ele próprio é atingido por uma doença grave. Nesta situação horrível, apresentam-se em sua casa três velhos amigos que procuram — cada um com palavras diferentes — convencê-lo de que, para ter sido atingido por tão variados e tão terríveis sofrimentos, deve ter cometido alguma falta grave. Com efeito, dizem-lhe eles, o sofrimento atinge o homem sempre como pena por uma culpa ou um pecado. No plano da justiça de Deus, conforme os amigos de Jó creem; Deus paga o bem com o bem e o mal com o mal.


O ponto de referência, neste caso, é a doutrina expressa noutros escritos do Antigo Testamento, que nos apresentam o sofrimento como castigo infligido por Deus pelos pecados dos homens. Deus é Legislador e Juiz: Vós, Senhor, sois justo em tudo o que fizestes; todas as vossas obras são verdadeiras, retos os vossos caminhos, todos os vossos juízos se baseiam na verdade, e tomastes decisões conforme a verdade em tudo o que fizestes que nos sobreviesse e à cidade santa dos nossos pais, Jerusalém. Sim, em verdade e justiça nos infligistes todos estes castigos por causa de nossos pecados (Dn 3,27-28).


Na opinião manifestada pelos amigos de Jó exprime-se uma convicção que também se encontra na consciência moral da humanidade: a Justiça exige uma pena para a transgressão, para o pecado e para o crime. Sob este ponto de vista, o sofrimento aparece como um “mal justificado”. Isso corresponde à opinião expressada por um dos amigos de Jó: Pelo que vi, aqueles que cultivam a iniquidade e os que semeiam a maldade também as colhem (Jó 4,8).


Jó, no entanto, contesta a verdade do princípio que identifica o sofrimento com o castigo do pecado; e faz isso baseando-se na própria situação pessoal. Ele, efetivamente, tem consciência de não ter merecido semelhante castigo; e, por outro lado, vai expondo o bem que praticou durante a sua vida. Por fim, o próprio Deus desaprova os amigos de Jó pelas suas acusações e reconhece que Jó não é culpado. O seu sofrimento é o de um inocente: deve ser aceite como um mistério, que o homem não está em condições de entender totalmente com a sua inteligência.


Se é verdade que o sofrimento tem um sentido como castigo, quando ligado à culpa, já não é verdade que todo o sofrimento seja consequência da culpa e tenha carácter de castigo. A figura do justo Jó é disso prova convincente no Antigo Testamento. A revelação, palavra do próprio


Deus, põe o problema do sofrimento do homem inocente com toda a clareza: o sofrimento sem culpa. Jó não foi castigado; não havia razão para lhe ser infligida uma tão duríssima pena. Da introdução do Livro deduz-se que Deus condescendeu com isto, por causa da provocação de Satanás. Vejamos o relato: Disse então o Senhor a Satanás: Reparou em meu Servo Jó? Não há ninguém na terra como ele, irrepreensível, íntegro, homem que teme a Deus e evita o mal. Será que Jó não tem razões para temer a Deus? Respondeu Satanás. Acaso não puseste uma cerca em volta dele, da família dele e de tudo o que ele possui? Tu mesmo tens abençoado tudo o que ele faz, de modo que os seus rebanhos estão espalhados por toda a terra. Mas estende a tua mão e fere tudo o que ele tem, e com certeza ele te amaldiçoará na tua face. O Senhor disse a Satanás: Pois bem, tudo o que ele possui está nas suas mãos; apenas não toque nele. Então Satanás saiu da presença do Senhor (Jó 1,8-12). O Senhor permite que Jó seja provado com sofrimento para provar a Satanás que Jó é um homem bom e justo não por “temer” a Deus, mas por amá-lo. O sofrimento é para provar o seu amor. O sofrimento tem caráter de PROVA.


O Livro de Jó põe de modo perspicaz, a pergunta sobre o porquê do sofrimento; e mostra também que ele atinge o inocente, mas ainda não dá a solução ao problema. Para descobrir o sentido profundo do sofrimento precisamos olhar para Jesus. Jesus, na Cruz é a resposta que Deus dá para a pergunta: porque o inocente sofre?


Deus amou tanto o mundo que deu o Seu Filho unigénito, para que todo aquele que crê n'Ele não pereça, mas tenha a vida eterna (Jo 3,16 ). Deus dá o seu Filho ao mundo para libertar o homem do mal, do sofrimento. Ao mesmo tempo, a palavra /deu indica que esta libertação deve ser realizada pelo Filho unigénito, mediante o seu próprio sofrimento.


Enquanto que até aqui as nossas considerações se concentravam, primeiro que tudo e, em certo sentido, exclusivamente, no sofrimento sob as suas múltiplas formas temporais (físicos e emocionais), agora as palavras do colóquio de Jesus referem-se ao sofrimento no seu sentido fundamental e definitivo. Deus dá o seu Filho unigénito, para que o homem não pereça; e o significado deste não pereça é cuidadosamente determinado pelas palavras que lhe seguem: mas tenha a vida eterna.


O homem perece, quando perde a vida eterna. O Filho Unigénito foi dado à humanidade para proteger o homem, antes de mais nada, deste mal definitivo e do sofrimento definitivo. Na sua missão de salvar, portanto, o Filho deve atingir o mal nas suas próprias raízes, que são o pecado e a morte que levam a perda da vida eterna. A missão do Filho unigénito consiste em vencer o pecado e a morte. E Ele vence o pecado com a sua obediência até à morte, e vence a morte com a sua ressurreição.



Cristo aproximou-se do mundo do sofrimento humano, em primeiro lugar por se fazer próximo aos homens que sofriam e que esperavam Sua ajuda. Curava os doentes, consolava os aflitos, dava de comer aos famintos, libertava os homens da surdez, da cegueira, da lepra, do demónio e de diversas deficiências físicas; por três vezes, restituiu mesmo a vida aos mortos. Era sensível a toda a espécie de sofrimento humano, tanto do corpo como da alma. Em segundo lugar pelo fato de ter Ele próprio sofrido. Durante a sua atividade pública, experimentou não só o cansaço, a falta de uma casa, a incompreensão mesmo da parte dos que viviam mais perto dele, a hostilidade, e por fim uma dolorosa morte.


Não tem aparência bela nem decorosa para atrair os nossos olhares... Foi desprezado e evitado pelos homens, homem das dores, familiarizado com o sofrimento; como pessoa da qual se desvia o rosto, desprezível e sem valor para nós. No entanto, ele tomou sobre si as nossas enfermidades carregou-se com as nossas dores, e nós o julgávamos açoitado e homem ferido por Deus e humilhado. Mas foi transpassado por causa dos nossos delitos, e espezinhado por causa das nossas culpas. A punição salutar para nós foi lhe infligida a ele, e as suas chagas nos curaram. Todos nós, como ovelhas, nos desgarrámos, cada um seguia o seu caminho; o Senhor fez cair sobre ele as culpas de todos nós (Is 53,2-6).


Ele, embora inocente, carregou-se com os sofrimentos de todos os homens, porque assumiu sobre si os pecados de todos. O Senhor fez cair sobre ele as culpas de todos nós (Is 53,6): todo o pecado do homem, na sua extensão e profundidade, se torna a verdadeira causa do sofrimento do Redentor.


Cristo sofre voluntariamente e sofre inocentemente. Ele acolhe, com o seu sofrimento, aquela interrogação — feita muitas vezes pelos homens — que foi expressa, num certo sentido, de uma maneira radical no Livro de Jó. Cristo, porém, não só é portador em si da mesma interrogação, Ele dá, também, a resposta mais completa que é possível a esta interrogação.


A Cruz de Cristo é a respostas para os nossos sofrimentos. E esta é, por assim dizer, a última palavra, a síntese do seu ensino como dirá um dia São Paulo: Pois a mensagem da cruz é loucura para os que se perdem; para os que se salvam é força de Deus (Cf. 1Cor 1,18).


As palavras da oração de Cristo no Getsêmani provam a verdade do amor mediante a verdade do sofrimento: Meu Pai, se é possível afasta de mim este cálice! Contudo, não se faça como eu quero, mas como tu queres! (Mt 26,39). E as que vêm a seguir: Meu Pai, se este cálice não pode passar sem que eu o beba, faça-se a tua vontade.


Depois das palavras do Getsêmani, vêm as palavras pronunciadas no Gólgota, que atestam esta profundidade — única na história do mundo — do mal do sofrimento que se experimenta. Quando Cristo diz: Meu Deus, meu Deus, porque me abandonastes? (Mt 27,46) Cristo experimenta o que nós experimentamos quando sofremos; o que experimenta um doente de câncer terminal, uma mãe que perdeu um filho, uma esposa que foi abandonada pelo marido depois de anos de vida conjugal... fez cair sobre ele a iniquidade de todos nós, (Is 53, 6). Na linha daquilo mesmo que mais tarde dirá São Paulo: A ele, que não conhecera o pecado, Deus tratou-o, por nós, como pecado (2Cor 5, 21).


A Cruz de Cristo tornou-se uma fonte da qual brotam rios de água viva. No último dia o mais solene da festa Jesus se pôs de pé e exclamou: Quem tiver sede venha a mim para beber: quem crer em mim, assim diz a escritura: de suas entranhas brotarão rios de água viva (Jo 7,37-38).


Na segunda Carta aos Coríntios, o Apóstolo escreve: Em tudo atribulados, mas não oprimidos, perplexos, mas não desesperados, perseguidos, mas não abandonados, abatidos, mas não perdidos, por toda a parte levamos sempre no corpo os sofrimentos de Jesus, para que também a vida de Jesus se manifeste no nosso corpo. De fato, enquanto vivemos, somos continuamente entregues à morte por causa de Jesus, para que a vida de Jesus se manifeste também na nossa carne mortal... com a certeza de que aquele que ressuscitou o Senhor Jesus, nos ressuscitará também a nós com Jesus (2Cor 4, 8-11.14).


Todo o homem tem a sua participação na Redenção. E cada um dos homens é também chamado a participar naquele sofrimento, por meio do qual se realizou a Redenção; é chamado a participar naquele sofrimento, por meio do qual foi redimido também todo o sofrimento humano.


Esta descoberta ditou a São Paulo palavras particularmente vigorosas na Carta aos Gálatas: Com Cristo estou cravado na Cruz; e já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim. E, enquanto eu vivo a vida mortal, vivo na fé do Filho de Deus, que me amou e se entregou a si mesmo por mim (2,19-20).


As testemunhas da paixão de Cristo são, ao mesmo tempo, testemunhas da sua Ressurreição. São Paulo escreve: Poderei conhecê-lo, a Ele e à força da sua Ressurreição, e ser integrado na participação dos seus sofrimentos, transformado numa imagem da sua morte, com a esperança de chegar à ressurreição dos mortos (Fl 3,10-11).


As testemunhas da Cruz e da Ressurreição estavam convencidas de que através de muitas tribulações é que temos de entrar no reino de Deus (At 14,22). Aqueles que participam nos sofrimentos de Cristo estão também chamados, mediante os seus próprios sofrimentos, a tomar parte na glória.


São Paulo exprime esta ideia em diversas passagens. Aos Romanos, escreve: Somos ... co-herdeiros de Cristo, se, porém, sofrermos com Ele, para sermos também glorificados com Ele. Tenho como coisa certa, efetivamente, que os sofrimentos do tempo presente não têm proporção alguma com a glória que há de revelar-se em nós (Rm 8,17-18).


Na segunda Carta aos Coríntios lemos: Realmente, o leve peso da nossa tribulação do momento presente prepara-nos, para além de toda e qualquer medida, um peso eterno de glória: não que nós olhemos para as coisas visíveis, mas para as invisíveis (2Cor 4,17-18).


O Apóstolo Pedro exprimirá esta verdade nas seguintes palavras da sua primeira Carta: Alegrai-vos, antes, na medida em que participais nos sofrimentos de Cristo, para que também vos alegreis e rejubileis na sua gloriosa aparição (4, 13).



Estas palavras impõem-se àqueles que são participantes dos sofrimentos de Cristo, com a força de um exemplo supremo. O sofrimento constitui também um chamamento a manifestar a grandeza moral do homem, a sua maturidade espiritual. Disto deram prova, ao longo das diversas gerações, os mártires e os confessores de Cristo, fiéis às palavras: Não temais os que matam o corpo e que não podem matar a alma (Mt 10,28). Na segunda Carta aos Coríntios, escreve: De boa vontade me ufanarei de preferência das minhas fraquezas, para que habite em mim a força de Cristo (2Cor 12,9) Na segunda Carta a Timóteo lemos: É também por esta causa que eu sofro estes males, mas não me envergonho: porque sei em quem depositei a minha confiança (2Tm 1,12). E na Carta aos Filipenses dirá o mesmo expressamente: Tudo posso naquele que me dá força (Fl 4,13). Na Carta aos Romanos, o Apóstolo Paulo pronunciar-se-á ainda mais detidamente sobre este tema do nascer da força no sofrimento: Gloriamo-nos também nas tribulações, sabendo que da tribulação deriva a paciência; da paciência a virtude comprovada; e da virtude comprovada a esperança. A esperança não engana, porque o amor de Deus se encontra largamente difundido nos nossos corações pelo Espírito Santo, que nos foi dado (Rm 5,3-5).


Pe. Gilson Sobreiro, pjc

Fundador da Fraternidade O Caminho



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